sábado, 8 de novembro de 2008

Limites




Muito se tem discutido em nossa sociedade a respeito da necessidade de se impor limites às crianças. Mas que limites? E como fazê-lo? Philippe Perrenoud tem um livro que eu acho fantástico, cujo título - “Ensinar: agir na urgência, decidir na incerteza” – traduz bem esta angústia de pais e professores.
Não existem receitas para saber como impor limites, nem listas com os limites que as crianças de cada idade devem ter, isto varia de família para família, de pessoa para pessoa. O limite aceitável de “bagunça” de uma casa é diferente em outra, para uma família é permitido comer biscoitos antes do jantar, em outra não, por exemplo. Diz o bom senso que o nosso limite acaba quando começa o do outro, mas nos dias atuais está difícil, até mesmo para muitos adultos, enxergar o outro. Assim sendo, seguem algumas dicas do que considero importante em se tratando de limites.
Firmeza com amor – sempre que a dúvida de como agir, ou a angústia de não saber estar agindo da melhor forma, surgir, pergunte-se se está fazendo com amor. Firmeza não é sinal de desamor, nem de violência. É possível (e recomendável) que sejamos firmes, amorosamente. A firmeza passa segurança para as crianças. Muitas vezes, quando elas insistem em nos contrariar, estão apenas certificando-se de que estamos certos e confiantes da resolução que tomamos. Por isso as crianças gostam das regras e dos limites, para se sentirem seguras. Devemos assumir o controle da situação. (isto inclui não transferir a autoridade para o outro responsável, o guarda, o “moço da loja ou do restaurante”, o lobo, a tia, etc.)
Ao mesmo tempo, é necessário que reflitamos, apesar da urgência do momento, alguns segundos pelo menos, antes de dizer “sim” ou “não”. E uma vez tomada a decisão, que possamos manter a palavra. A constância é muito importante na tarefa de educar. Às vezes um dia em que não se está “a fim de se aborrecer”, desconstrói todo um trabalho que havia sido feito. Neste caso, não resta outra solução a não ser começar tudo outra vez. Educar é uma tarefa árdua, pois tem que ser todo-o-dia. Se um dia pode algo e outro não, a criança fica confusa, e vai tentar que no dia seguinte possa também. É claro que as situações são diferentes e complexas. Não dá para ser tudo igualzinho. Neste caso, explique de uma maneira simples. Mesmo que a criança não entenda 100% o seu argumento, entenderá a explicação através da emoção, do tom de voz. É preciso que haja coerência nas nossas ações. Falando em coerência, lembremos que o exemplo ainda é uma ótima maneira de educar...
Uma outra dica é não “entrar em discussão” com a criança. Falar mil vezes a mesma coisa, por exemplo. Uma vez é suficiente. Repetir não fará com que ela faça o que está sendo pedido, a não ser, na milésima vez, quando então o pedido for mais incisivo, ou acompanhado de outras atitudes... Que tal olhar no olho do nosso filho e pedir-lhe que vá tomar banho, ou fazer a lição de casa, ou desligue a televisão? Se não funcionar da primeira vez podemos nós mesmos leva-lo a fazer. É preciso dar importância e seriedade ao que falamos, só então nossos filhos farão o mesmo. Será que quando falamos “mil vezes”, as primeiras vezes não foram apenas por hábito, sem que nós mesmos acreditássemos em nossa ordem?
Todas estas medidas devem ser acompanhadas de outras como o respeito, o incentivo, a promoção da autonomia e da responsabilidade. Não adianta impor limites se infantilizamos a criança. Yves de La Taille utiliza a metáfora do limite em dois sentidos: o de impor limites – que foi abordado aqui até agora – e o de transpor limites: como superar-se. Uma criança que consegue, por exemplo, andar pela primeira vez de bicicleta sem rodinha, vestir-se só, tirar uma boa nota na escola, aprender a nadar, fazer amigos, etc... o primeiro sentido da metáfora só é válido se for acompanhado do segundo, caso contrário estaremos apenas tolhendo nossos filhos.
Fazer a criança participar da vida da família é outra dica. Muitos pais reclamam que os adolescentes são alheios aos problemas da casa, mas é preciso que ele seja acostumado a sentir-se integrante desta família, com tarefas e responsabilidades, não só relativas a ele, como manter seu quarto arrumado, mas que o fazem sentir-se útil ao grupo familiar. Desde pequenas as crianças podem ajudar, por exemplo, colocando a mesa para uma refeição, guardando as compras na geladeira, cuidando dos animais de estimação, etc. Conforme vão crescendo suas responsabilidades podem ir aumentando.
Resumindo: firmeza, constância, coerência, amor, respeito, responsabilidade.
Utilizei a terceira pessoa do plural neste artigo, pois além de educadora e psicopedagoga sou mãe e sei quão angustiante e trabalhosa é a questão dos limites. Mas a tarefa de educar torna-se menos árdua quando podemos dividi-la. Por isto sintam-se à vontade para usar este espaço, deixando comentários!

Referências bibliográficas:

PERRENOUD, Philippe. Ensinar: agir na urgência, decidir na incerteza. Porto Alegre: Artmed, 2001.
TAILLE, Yves de. Limites: três dimensões educacionais. São Paulo: Ática, 2006.

Gostou do blog? Vote antes de sair:



Um comentário:

buuuuuu disse...

Ótimo texto! Adorei!

"Firmeza não é sinal de desamor, nem de violência". Acho que essa frase foi a mais marcante para mim, porque nem todos os pais têm em mente este fato.

Atualmente há pais ou tratando os filhos com desamor, na rigidez ou com uma liberdade desregrada, querem ser amigos dos filhos. Em ambos os casos os limites não são saudáveis na minha opinião. Um é rígido e repressor demais, o outro é sem foco, sem uma direção.

Não faço o gênero tradicional, muito pelo contrário, mas acredito que toda criança precisa de parâmetros, de pontos de referências para ajudá-la a se tornar um adulto com a personalidade, características, comportamentos e atitudes de um determinado jeito.

Educar dá trabalho sim! Mas é necessário, pois é um dos fatores que nos ajudam a ser adultos melhores.

Beijos!

Vanessa